OS "IRMÃOS"DE JESUS

17/02/2014 23:13

 

    De um modo geral, ainda é tema muito contraditório para os religiosos (não poderiam ser excluídos alguns confrades que compõem o movimento espírita). Muitos, influenciados pelos dogmas e critérios impostos pelas religiões através dos séculos e outros pelo desconhecimento.
Abordando-o historicamente, quando se fala na família de Jesus geralmente se pensa só em Jesus, Maria e José: a sagrada família. Na verdade, o Novo Testamento refere-se a um círculo mais amplo, fala-nos em "irmãos" e "irmãs" do Senhor. Quem eram eles? Os Evangelhos oferecem indicações fragmentárias, sem definir de quem se trata: se são irmãos verdadeiros, filhos de um casamento anterior de José, ou, simplesmente, primos – parentesco este o mais acertado, visto que no judaísmo o conceito de parentesco era muito elástico.
    O evangelista João, por exemplo, conta que, após o milagre de Caná, Jesus "desceu para Cafarnaum, ele e sua mãe, seus irmãos e seus discípulos" (2,12). Também Mateus (12,46-50), Marcos (3,31-35) e Lucas (8,19-21) mencionam a presença da mãe e dos irmãos em Cafarnaum. Depois da pregação na sinagoga de Nazaré, as pessoas se perguntam: "Não é este o carpinteiro, filho de Maria, irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Não vivem aqui entre nós também suas irmãs?" (Marcos 6,3; Mateus 13,55-56). Os irmãos são mencionados pelos nomes, mas não se informam os nomes nem o número de irmãs, sinal de que não tiveram muita importância na primitiva igreja palestina.
    O livro Atos dos Apóstolos também fala dos irmãos como de um grupo paralelo ao dos discípulos: "Todos estes [os onze] perseveraram unanimemente em oração, com as mulheres, e com Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele" (1,14). Em duas ocasiões Paulo fala dos irmãos do Senhor: uma vez a propósito de Tiago, que se chama de "irmão do Senhor" (Gálatas 1,19), e outra em I Coríntios 9,5.
Voltemos, porém, à pergunta inicial: quem eram eles? O primeiro autor pós-apostólico que cita os irmãos do Senhor é Egésipo (século II), provavelmente originário da Palestina, que sabia grego, hebraico e siríaco, e que pertencia, segundo o historiador Eusébio, àprimeira geração pós-apostólica.
    Esse autor podia, portanto, fundamentar-se em antigas tradições palestinas. Pois bem, ele dá a entender – por alto, como se se tratasse de fato conhecido – que aqueles a que os Evangelhos chamam "os irmãos do Senhor" são, na verdade, seus primos. Mas já na segunda metade do século II, quando começam a surgir as dificuldades e, por conseguinte, quando a questão é colocada ex professo, difunde-se a opinião de que se trata de filhos de um casamento anterior de José. Esta opinião, amplamente aceita pelo cristianismo oriental, encontrou raros defensores na igreja latina.
Num livro escrito para contestar um certo Elvídio (que afirmava tratar-se de irmãos verdadeiros de Jesus, filhos de Maria e José), Jerônimo ataca o problema valendo-se de todo o seu arsenal exegético, e refuta tanto a tese dos irmãos verdadeiros como a dos meio-irmãos, chegando à conclusão de que são primos. Essa opinião prevaleceu na igreja latina.
    Hoje podemos afirmar, simplificando, que para os protestantes prevalece a tese dos irmãos verdadeiros (com exceções significativas), enquanto entre os católicos é unânime a opinião de que se trata de primos ou, genericamente, de parentes.
    Mencionamos a elasticidade do conceito de parentesco no judaísmo, mas contra essa constatação – que resolveria facilmente o problema –, há o argumento de que tal elasticidade valeria só para as igrejas de língua aramaica, não para as de língua grega. Como se explica, então, que os autores neotestamentários, que escreveram em grego, não tivessem substituído o termo "irmão"?
    Existe um exemplo análogo: os judeus de Alexandria, que traduziram para o grego a Bíblia hebraica (chamada dos Setenta, ou LXX), mantiveram o termo "irmão" mesmo quando o texto sugeria um grau mais distante de parentesco.
    A isso se soma o peso da tradição cristã mais antiga, que exclui a hipótese de que se trate de verdadeiros irmãos, filhos de Maria. O fato de os Evangelhos terem conservado o termo irmão (Paulo de Tarso fala de "irmãos do Senhor") pode ser explicado por um argumento convincente. É sabido que o grupo dos irmãos do Senhor ocupava na igreja palestina posição de grande prestígio, ao lado dos apóstolos. Na I Epístola aos Coríntios, já citada, Paulo nos faz compreendê-la com clareza. Os evangelistas mantiveram a expressão porque esta indicava um grupo, uma dignidade e um papel, não simplesmente um parentesco.
    Pode-se dizer, com honestidade, que a defesa de uma ou outra tese envolve – e não poderia ser de outra forma – também razões teológicas: o católico, por exemplo, está convencido da perpétua virgindade de Maria. Mas foi na doutrina espírita-cristã, através do coadjuvante de Allan Kardec – J.-B. Roustaing –, que os espíritos explicaram, na obra Os Quatro Evangelhos - Revelação da Revelação (tomo II, pp. 312 e 313, 7ª edição), a situação dos "irmãos" de Jesus, confirmando que a palavra "irmão", em hebreu, tinha várias acepções:
    "Ao mesmo tempo, significava o irmão propriamente dito, o primo co-irmão, o simples parente. Entre os Hebreus os descendentes diretos da mesma linha eram considerados irmãos, se não de fato, ao menos de nome e se confundiam muitas vezes, tratando-se indistintamente de irmãos e irmãs. Geralmente designavam pelo nome irmãos os que eram filhos de pais-irmãos, os que agora chamamos primos-irmãos.
"Os chamados irmãos e irmãs de Jesus eram, segundo o parentesco humano que entre eles havia aos olhos dos homens, seus primos-irmãos.
"Maria não era filha única; tinha uma irmã, que também se chamava Maria, mulher de Cleofas (Alfeu) e mãe de Tiago, de José, de Simão e de Judas, que os homens tratavam de irmãos de Jesus.
    "Do mesmo modo, as chamadas irmãs deste eram suas primas co-irmãs, de acordo com o parentesco humano que, segundo os homens, havia entre elas e o Mestre."
    Sobre esse belíssimo tema, sinceramente indicamos aos confrades a leitura da obra Irmãos de Jesus, de Kruger Mattos, editada pela Federação Espírita Brasileira, e que é o resumo da Conferência Evangélica realizada no salão de conferências do Centro Espírita União, Humildade e Caridade, com sede em Juiz de Fora, estado de Minas Gerais, em 9 de maio de 1943. Essa obra, prefaciada por Manoel Quintão, esgota o assunto "e seu trabalho não precisa de anteparos, vale pela só estrutura e o seu nome não requer credenciais". Assim expressou-se aquele emérito espírita com relação ao livro e seu autor.


(Transcrito de O Franciscano, editado pela Associação Espírita Francisco de Assis, Rio de Janeiro)

Postado por SERGIO RIBEIRO

Fonte: https://oespiritodaverdade.blogspot.com.br/2009/08/os-irmaosde-jesus.html